12 novembro, 2011

Spleen



Spleen

Quando o cinzento céu, como pesada tampa,
Carrega sobre nós, e nossa alma atormenta,
E a sua fria cor sobre a terra se estampa,
O dia transformado em noite pardacenta;

Quando se muda a terra em húmida enxovia
D'onde a Esperança, qual morcego espavorido,
Foge, roçando ao muro a sua asa sombria,
Com a cabeça a dar no tecto apodrecido;

Quando a chuva, caindo a cântaros, parece
D'uma prisão enorme os sinistros varões,
E em nossa mente em frebre a aranha fia e tece,
Com paciente labor, fantásticas visões,

- Ouve-se o bimbalhar dos sinos retumbantes,
Lançando para os céus um brado furibundo,
Como os doridos ais de espíritos errantes
Que a chorrar e a carpir se arrastam pelo mundo;

Soturnos funerais deslizam tristemente
Em minh'alma sombria. A sucumbida Esp'rança,
Lamenta-se, chorando; e a Angústia, cruelmente,
Seu negro pavilhão sobre os meus ombros lança!

Charles Baudelaire, in "As Flores do Mal"
Tradução de Delfim Guimarães


O Spleen é um termo de origem inglesa que a literatura francesa incorporou no século XVIII para indicar uma sensação de fastio sem motivo.

Segundo estudo do português José Fernando Guimarães:

“Será que essa dor - nas palavras de Baudelaire, melancolia, desespero, spleen - deriva do olhar do poeta ou, pelo contrário, é intrínseca ao próprio tempo em que vive, em que sente, em que pensa?

Formulada assim, a questão torna-se falaciosa (capaz de interpretações onde pode predominar o psicologismo e/ou o historicismo) - quando, para mais, qualquer olhar artístico decorre, irremediavelmente, do seu tempo, é o seu tempo.

Coloque-se, então, a questão de outra maneira: será que tal presente foi capaz de marcar dolorosamente o olhar de Baudelaire? A resposta é, em toda a sua extensão, afirmativa.

É-o, por um lado, por causa da paixão pela sua mãe - uma paixão dolorosa, como qualquer paixão, mas, mesmo assim, constantemente espicaçada, reavivada pela palavra poética.

É-o, por outro lado, por causa de Poe - nele Baudelaire revê a sua biografia, pelo menos a axial (a família, sempre a família, com o cortejo de um pai ausente, da mãe desejada e da(s) amante(s), dolorosa teia capaz da mais feroz melancolia); tal como a partir dos textos de Poe (sobre a sua vida e obra escreveu um longo ensaio, para além de ter traduzido os seus contos), faz colagens, desidentifica-os para deles se apropriar, para os voltar a marcar, agora com a sua assinatura.”

Um comentário:

Anônimo disse...

adorei.
obrigada.
gi

A bailarina