18 setembro, 2008

Linuagem do Corpo - O Beijo

“De todos os lugares do corpo que o beijo visita, geralmente o mais cantado ainda é a boca, talvez porque a carne enfim nela aflore como em si mesma, vermelha, redonda, desejável, e que ela se abra nesse ponto, como um fruto, ao meio” (Cahen, 1998).

O Beijo, 188-1889. Auguste Rodin, Museu Rodin.

Ao mencionarmos o beijo, a primeira coisa que geralmente vem à mente é o beijo dos apaixonados. Há, porém, vários tipos de beijos com seus respectivos significados. Os beijos podem ser eróticos, carinhosos, voluptosos, falsos, protocolares, sagrados, narcísicos, ou até desconhecidos em algumas culturas.

O beijo está presente em momentos marcantes da história, das artes e da literatura, como o sopro divino de Deus em Adão, o beijo de Judas em Cristo, o beijo de Drácula e os beijos dos contos de fadas. Sua origem é desconhecida, mas é aceita uma teoria evolucionista de que o beijo tenha raízes no ato das mães alimentarem os filhos boca a boca na pré-história. Por sua vez, para a Psicologia, o beijo pode estar relacionado ao ato da criança sugar o seio da mãe.

Na Bíblia, o Cântico dos Cânticos mencionava o erotismo do beijo, mostrando que não é dos tempos atuais o significado dos beijos apaixonados. Veja-se este trecho:

“Que belo é o teu amor, ó minha irmã, noiva minha! Quanto melhor é o teu amor do que o vinho...Os teus lábios, noiva minha, destilam mel! Mel e leite se acham debaixo da tua língua...” (4, 10-11).

O Beijo, 1892. Edvard Munch, Museu de Arte Moderna.

O beijo na boca não poderia ser explicado apenas levando em consideração a estética, pois ele está associado também a sua própria história. Não se sabe ao certo sua origem, mas as referências mais antigas datam de 2.500 a.C., registradas nas paredes dos templos de Khajuraho, na Índia.

Afresco em parede de templo em Khajuraho, Índia.


Afresco de Shiva, Índia.

Em algumas culturas o beijo na boca não apresenta nenhuma malícia. Nos EUA, é comum as mães beijarem seus filhos nos lábios. Os homens persas também trocavam beijos na boca, mas somente entre os que pertenciam à mesma classe social. Se um dos homens fosse considerado inferior, o beijo deveria ser dado no rosto. Da mesma forma, entre os romanos era permitido que os nobres mais influentes beijassem-se nos lábios, enquanto os menos influentes deveriam beijar as mãos.

Fragmento de pintura em jarro grego, 520 a.C., Museu do Louvre.

Desde à Antigüidade, o beijo poderia ser encontrado sem significado de sexo entre pais, filhos e amigos, por demonstrar grande respeito, afeto, amizade e perdão. Os gregos são um exemplo disso, pois permitiam até a metade do século IV a.C. beijos na boca entre pais e filhos, irmãos e amigos; porém, essa prática não era realizada com intuito de saudação entre aqueles que não fossem próximos. Fora das convenções sociais ou das efusões entre parentes ou amigos queridos, o beijo conheceu na Grécia o favor dos amantes do mesmo sexo.

Terracota do séc. I d.C, de origem romana. Museu Britânico de Arte.

Em Mégara, no templo de Teócrito (século III a.C.), desenvolveu-se um concurso de beijos reservado aos homens. Aquele que imprimisse os lábios o mais suavemente sobre os do juiz voltava para casa “carregado de coroas”. O concurso ocorria na tumba de Diocles, guerreiro que havia protegido seu amado durante uma batalha, cobrindo-o com seu escudo, e dando a vida para salvá-lo. Os beijos desses homens imortalizavam a bravura do herói, recompensando-o postumamente.

No período da Renascença, o beijo na boca era tido como uma saudação. Na Inglaterra era comum o visitante beijar na boca o anfitrião, sua esposa, filhos, e até mesmo, cachorro ou gato. Na Rússia, o beijo do Czar era considerado como uma das mais altas formas de reconhecimento.

No século XV, enquanto os nobres franceses pudessem beijar qualquer mulher que desejassem, os italianos deveriam se casar com aquela mulher que beijaram em público. Na Escócia, era comum os padres beijarem os lábios da noiva no final do casamento, pois essa benção simbolizava a felicidade conjugal. Durante a festa de casamento, as noivas circulavam entre os convidados e beijavam na boca todos os homens, que em troca lhes davam algum dinheiro.

Foi a partir do Renascimento que o beijo perdeu sua função oficial e sagrada. O beijo que antes era tido como um ato de paz entre os fiéis e o clérigo, passou a ter conotação erótica. Atualmente, os fiéis católicos partilham a paz com um aperto de mão. Os únicos beijos sagrados ainda praticados são os do sacerdote durante os atos litúrgicos.

O beijo erótico é comum na cultura ocidental, árabe e hindu. Em algumas sociedades, o beijo é totalmente desconhecido, como entre os Somali, Cewa, Lepcha e Sirionó. Em outras, o beijo é repugnante, como no caso dos Tongas, do sul da África. Estes consideram os contatos boca-a-boca revoltantes, devido à possibilidade de troca de saliva.

O Beijo, 1916. Constantin Brancusi. Museu de Arte da Filadélfia.

Na linguagem dos esquimós, a palavra beijo significa cheirar, por isso, eles esfregam os narizes. Além deles, os Talmi, Ulithi e Trobriandeses praticam o gesto de roçar os narizes. No nordeste brasileiro, o beijo também tem essa conotação de cheiro.

Na cultura árabe, o clássico da literatura erótica O Jardim Perfumado, instrui que

"O beijo deve ser sonoro. Seu som, rápido e prolongado, se eleva pelo movimento da língua e a borda úmida do paladar, produzido pelo movimento da língua na boca e o da saliva provocado pela sucção. Um beijo dado na superfície dos lábios e acompanhado por um som como o que fazemos para chamar um gato, não dá nenhum prazer. Esse beijo é bom para as crianças ou quando é dado nas mãos. O beijo descrito antes, e que acompanha a cópula, provoca uma voluptuosidade deliciosa.”

Um outro tipo de beijo erótico é o beijo olfativo ou beijo-cheiro, em que o nariz é colocado próximo ao do parceiro e então se respira fortemente. Este era um dos beijos que os egípcios usavam na Antigüidade.


Fontes:
GREGERSEN, Edgar. Práticas Sexuais: a história da sexualidade humana. São Paulo: Roca, 1983.
CAHEN, Gérald (coord). O Beijo. São Paulo: Mandarim, 1998.
DUARTE, Marcelo; BOUER, Jairo. O Guia dos Curiosos: Sexo. São Paulo: Cia das Letras, 2001.

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